A poesia está morta,
Morta como uma pedra
E em sua pele fria
Os resquícios dos versos,
A palidez do último dia.
A poesia está morta,
Morta como quem a faz,
Como o poeta que vê seus olhos,
Como o abismo desesperado
Na escuridão mordaz.
Morta nas cinzas do esquecimento,
Contra as paredes de aço no vento;
Morta, sem sombras, sem refletir
A última tristeza do peito,
Sem ter o primeiro relento.
Quem a lê já não vive
E das lágrimas de sangue enxutas
A mancha negra se infiltra na alma;
Mas morta como quem morreu,
Não como quem deseja amá-la.
A poesia está morta,
Sem chance de respirar sua dor,
Sem chance de viver por amor;
Morta, esmagada pelos sentimentos
Que já não batem em sua porta.
Beija à face do solitário rio,
Já sem correntezas e braços;
Afoga-se no mar seco
E encontra-se na praia
Árida onde não há deserto.
O sol já não lhe aquece mais,
A lua já não lhe inspira,
A rosa já não tem cheiro…
E agora? Há ainda virtude
No seu infeliz leito?
A poesia está morta,
Parada sob a penúria do quarto;
As janelas não refletem o horizonte,
O cigarro, morto, também não acende;
A chama, morta, já não ascende.
O que resta de seu corpo senão versos?
O que resta de sua alma senão sonhos?
O que resta de si senão verdade?
Não há versos, não há sonhos,
Tampouco verdade, talvez nada.
Mas a sua morte ainda insiste,
Pois embora não exista
Ainda lembra-se da intensidade.
A poesia está morta, tão morta,
Tão seca, tão profunda, tão viva.
Itacoatiara-AM, 9 de janeiro de 2020.