Capítulo 8

George acordou com o canto dos sabiás, com bruma da
nevoada tocando-lhe o rosto, Megan estava ali, em pé esperando
que ele acordasse.
— O que você está fazendo aqui? — perguntou George,
impressionado.
— Eu só queria saber se você mora aqui mesmo ou se só
estava brincando, eu bem que queria ter vindo ontem, mas já
estava tarde. Por que você não foi para aula ontem? — respondeu
Megan, com preocupação.
— Eu estava muito doente, mas já estou melhor agora. —
Disse George, um pouco mais calmo com a presença de Megan.
Megan parou um pouco e ficou pensativa, e se incomodou com
uma situação.
— Cadê seus pais, sua família, seus amigos? Você é muito
diferente, misterioso, não sei explicar. — disse Megan, com o
rosto cheio de dúvidas.
— Você promete que não vai contar pra ninguém? Perguntou
George com uma tática infalível de instigar ainda mais o interesse
de Megan por ele.
— Sim, vamos ser amigos, certo? Amigos não têm segredos.
George deveras sente que deve se abrir a seu amor, mas
estava receoso de não ser compreendido. Enquanto isso só
conseguira exprimir:
— É uma longa história, você não vai entender absolutamente
nada.
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— Sou bastante fértil quanto à interpretação. — disse confiante
e curiosa, Megan, certa de que iria tirar essa curiosidade ainda
hoje.
— Bem, como eu começo? Existiam dois pássaros que tinham
um filhotinho bem pequenino mesmo. Esses pássaros passaram
um sufoco, pois o novo líder de pássaros não permitia que eles
saíssem da determinada bolha de um determinado espaço, os
pássaros além de não voarem livremente, também não podiam
alimentar-se livremente, tudo era regulamentado por este líder.
Ninguém podia rebelar-se, nem ousar criticar o modo em que
esse líder se comportava. Sendo assim, esse casal de pássaros
resolveu, enquanto o líder e seus capachos estavam dormindo,
deixar esse pequenino filho protegido dentro de um túnel, que se
interligava à floresta. Esse pequenino fora achado por um grupo
de leões, que cuidaram dele até os dez anos, quando começou a
criar asas, podendo ser livre e voar para qualquer lugar. — disse
George, totalmente descrente de que Megan entenderia.
Megan parou um pouco, assimilou tudo aquilo, e disse:
— Seus pais sofreram em algum regime totalitário e tiveram
que deixar você em um lugar seguro, certo? O que representa os
leões?
— Sim, exatamente é isso, a única diferença é que meus pais
me colocaram em uma bagagem de um avião que ia para a
Europa, e esse avião caiu. Eu sobrevivi e fui resgatado por uma
família de leões, que cuidaram de mim; quando completei dez
anos resolvi, por conselho do leão chefe da família, que deveria
pegar aquele metrô para vir a qualquer cidade. Segundo eles,
meu lugar não era na floresta, e eles tinham razão. — disse
George com o rosto um pouco cabisbaixo, crente de que
assustaria Megan, e que ela se afastaria dele por pensar que o
mesmo teria insanidade mental. Porém o resultado foi o contrário
disso e Megan estava cada vez mais curiosa.
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— Me conte mais sobre você! — Megan estava ainda mais
curiosa.
— Sim, então peguei esse metrô e parei aqui, fiquei um bom
tempo comendo lixo e lendo os livros que muitas vezes estavam
lá (sim, os leões me alfabetizaram), com catorze achei essa casa
onde estou até hoje. Ah! E hoje é meu aniversário (um fato que
passara despercebido: dia primeiro de Agosto comemora-se o
aniversário de George). — complementou George tendo que se
segurar para não dar um doce beijo em Megan, eles estavam bem
próximos, e nem se deram conta que estavam tocando nas mãos
um do outro.
Megan sem saber o que dizer, sem reação nenhuma, resolver
dizer:
— Feliz aniversário, George, hoje é seu aniversário, mas foi
você quem me deu um belo presente.
— Só de você estar aqui já é o presente mais importante que
eu poderia ter, posso lhe ser sincero? — disse George, que já se
declararia em seguida.
— Oh, George! Assim eu fico sem jeito. — disse Megan, um
pouco surpresa com a resposta ousada de seu futuro amado.
— Pode sim. Aliás, o que você tem pra me dizer? —
acrescentou Megan.
— Tudo começou quando te vi na calçada de pedra, você
chamou minha atenção, e eu posso mostrar a você o trecho que
está aqui em minha mente (risada leve), mas sério, seus cabelos
e seus olhos de esmeralda estavam brilhando e eu vi desde o
horizonte (de repente Megan interrompeu George).
— Então é você o Sir. Desconhecido? Eu espero que seja. —
disse Megan.
— Sim, eu lhe mandei as duas cartas com as poesias. —
respondeu George.
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— Eu lhe segui naquele dia, mas cheguei mais tarde aqui, eu
queria pegar você de surpresa, mas acabei caindo. — repetiu
Megan.
— Eu sabia disso desde o início! — enfatizou George.
— Sé… — Megan foi interrompida com um leve beijo.
— Sério? — perguntou Megan, mas não resistiu ao leve beijo,
e pela primeira vez em cinco meses segurou George com força
(que retribuiu e deu-lhe o beijo que podemos considerar). Bem
quente e com vários detalhes que não podem ser expostos aqui,
mas fica na imaginação e da percepção de cada um, portanto
uma nova etapa na vida dos dois ainda estava começando, mas
ainda não eram namorados até o momento.
Acariciando a pele de sua amada, macia como neve do
inverno, George estara deitado com Megan, ela estava sobre seu
peito, e ele começou a pensar em alguns versos:
AS AMARRAS INVISÍVEIS
Nos teus olhos a inspiração,
Um futuro congestionado de esperança,
Escrever-te-ei o véu de nossa aliança
Alçado na volúpia da esbelta união.
Se aquilo que sinto em contramão
Munir o teu desejo de obscuridade,
Trar-te-ei o encontro à verdade
Para ousar ingressar ao teu coração.
Descobriremos um universo de angústia,
Imunizar-lhe-emos com um antídoto,
Calcado no resumo da misteriosa loucura.
Daremos a majestosa cura
À alma dos destroços fenecidos
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Nos campos de flores amordaçadas.
E ela completou aquilo, com um dos versos da poesia do Sir.
Desconhecido:
Se para conquistar-te houver um temor,
Destrui-lo-ei formando o que usarei
Para pedir-te a mão, como sempre sonhaste!
— Sonhei todos os dias com você, não sei por que sempre tive
a certeza de que era você esse exemplo de cavalheiro. — disse
Megan, emocionada.
— Imagino-me agora num filme, e como fundo musical, o
melhor de Beethoven, Chopin, Mozart ou Bach, num castelo com
detalhes antigos, deitado com você em uma cama enorme e
confortável de frente ao mar, e quando eu declamasse uma
poesia a ti, que ressurgisse das nuvens a música Clair de Lune,
de Debussy. Será que é errado sonhar muito? — acrescentou
George, imaginando tudo aquilo, enquanto Megan olhava para
ele admirada, e ao mesmo tempo imaginando, e de seus olhos
surgiram gotas da emoção, pela primeira vez na vida sentira
aquilo.
A realidade é que os dois foram feitos um para o outro, um
completava o outro, poderiam crescer juntos, viajar juntos, sofrer
juntos. Essa é a lógica de um relacionamento saudável, que
nunca acaba quando a chuva passa, quando o sol se põe, quando
a tempestade surge, quando a nuvem traz consigo as
dificuldades, quando as quatro estações desaparecem no vácuo.
— Espero que isso não seja um sonho. — disse um pouco
temerosa Megan, refletindo sobre o que acabara de acontecer.
— Não é sonho, é realidade! Tenho grande fé em Deus que
iremos construir uma família, seremos pessoas bem sucedidas.
Agora está muito cedo para começarmos a namorar, vamos
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esperar o que o tempo tem para nos oferecer, quando nós dois
percebermos, será a hora certa. — disse George, esperançoso.
— Sim, estou de acordo, hoje foi nossa primeira vez, no dia do
seu aniversário. Eu sei que o destino nos uniu. — disse Megan.
— Eu estudava em outra escola, deslumbrei-me um dia ao te
ver, certa vez acordei um pouco tarde e vi-te sair de casa, segui-te
até a escola. Na semana seguinte fui transferido para lá,
apenas para te conhecer, apenas para pôr em prática os contos
de amor narrados séculos pela humanidade. — disse George,
com o pensamento distante, lembrando-se de tudo que houvera
feito para que esse momento chegasse.
— Acho que tu és o amor de minha vida, as circunstâncias que
circundam nosso plano não batem; nem deverias estar aqui,
poderias estar morto, poderias estar nas florestas, menos aqui.
Algo nos atraiu, como um imã gigantesco pareado a esta casa. —
raciocinou Megan.
Passara a mente de Megan um poema de Sir. Cavalcanti,
datado de mil novecentos e dez, há exatos oitenta anos, o poema
era o seguinte:
REFLECTIONS OF LIFE
The life is more important than the tears,
Because we can see in the window
Of the time what was lost;
Is younger than death,
Than the old way to ask for shelter.
Because what was lived
Is what hasn’t been forgotten
And what will never return…
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How could I know that this would happen now?
Now there’s nothing what to do.
How could I see what was not seen?
So many doubts wander in the empty.
How could you speak yourself
That nothing was said?
Tears in heaven declaim that
The life is deeper than any thought.
Many want to be the lords of truth,
But few can climb the first step,
Few can have the rare authenticity;
Many will blame other for mistakes
Made by the egoism of self-inexistence.
Now there’s nothing what to do.
Este poema poderia muito bem acompanhá-los na caminhada
da vida, uma verdadeira reflexão, muito bem alinhada com o
modo em que os dois observavam o mundo. Então resolveram
sair um pouco e passear pela cidade, já estavam de férias e
poderiam fazer o que quisessem.
Mas antes de sair, George resolveu contar sobre o senhor
Beethoven, e mostrou todas as cartas, contou toda a história, toda
a experiência; inclusive George só não estava triste naquele
momento por causa de Megan. Ela leu tudo, compreendeu a
situação, e subiu junto com George às escadas do sótão;
impressionada com os cinquenta mil dólares, em seguida. Entre
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os dois não deveria haver segredos, porém Megan não tinha nada
fora do comum.
O que George poderia fazer com todo aquele dinheiro?

 
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