O grande dia havia chegado, e o poeta estava ansioso, tinha
alugado um terno para a cerimônia, e aconteceria no Teatro
Amazonas, conforme o cartaz.
Vários anúncios eram produzidos nas rádios locais, não era algo
estrondoso, porque o brasileiro comum fica ansioso com um filme,
até com uma música, mas as pessoas em geral não ficavam
ansiosas por lançamentos de livros; lembrando que o mercado
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editorial é mais forte quando produz livros didáticos para escolas,
e quando algum tem a sorte de cair no gosto popular.
George continuaria com seu pseudônimo, e agora estava com
sua marca de escritor, era mais ou menos sua assinatura poética,
esse nome não era comum e não era nem um pouco nome
brasileiro, o que poderia gerar curiosidade nos leitores, quem
sabe.
Nunca há um objetivo alcançado sem persistência.
Essa frase estava no último verso da contracapa, na nota da
editora estava destacado o talento do jovem poeta, estava
destacado um pouco de sua trajetória, o editor fez questão de
colocar que o jovem já tinha mais de uma poesia, e ainda brincou:
“Ele, em menos de cinco anos
fez mais de oitocentas poesias, e
eu com quarenta não fiz
nenhuma linha, nem para minha
esposa escrevo direito, pois sou
muito ruim; brincadeiras à parte,
se ele for valorizado aqui no
Amazonas, com certeza será
valorizado em todos os lugares
do país, se não for valorizado,
será em algum outro país com o
mínimo de cultura. ”
A essa altura do tempo, George percebeu que já tinha oito
livros somente com poesia, dois com duzentos e cinquenta
páginas, dois com duzentos e vinte páginas e o resto com
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duzentas páginas. Para ele, estava na hora de escrever um de
ficção, ou alguma história que prendesse a atenção das pessoas.
Mas iria pensar nesse projeto depois de lançar seu primeiro
livro. Aquela tarde ele faltou no trabalho, o gerente sabia o motivo
e estava dando todo o apoio possível a George, inclusive deu até
o adiantamento da semana; o poeta passou a tarde se
preparando para aquela cerimônia especial do dia quatro de julho.
No entanto estava preparando seu discurso, bem estruturado.
Separou algumas poesias para ler ao grande público; o discurso
dizia:
Boa noite a todos! Queria
agradecer primeiramente a Deus a
oportunidade de estar aqui, depois
à Editora Manaus que me recebeu
de braços abertos nesse
lançamento ao meu futuro de
escritor. Sei que não é necessário,
mas irei contar um pouco sobre
minha longa caminhada, e o porquê
de eu estar superando as
dificuldades da vida de maneira
mais comum, com menos
dificuldade e com bastante
resiliência.
Meus pais foram assassinados
pelos comunistas no regime
totalitário soviético, antes de serem
assassinados me mandaram para
um lugar desconhecido, antes de
serem aprisionados nos gulags me
enviaram por meio de um soldado
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(que era exceção) que era amigo de
meu pai, para bem longe dali.
Vim parar aqui no Amazonas e
fui acolhido na casa de uma
senhorinha (ele tinha que inventar
isso, senão ninguém acreditaria),
ela nem conseguia se sustentar
direito e era sozinha, porém me deu
a melhor educação possível; ela era
muito inteligente e ainda me
alfabetizou. Certamente era alguma
parente distante daquele soldado
soviético.
Fui crescendo, e quando eu tinha
dez anos ela morreu, e fiquei sem
ninguém, não tinha nenhum
conhecido, e estava aqui, no interior
do Amazonas. Passei muita fome e
era morador de rua, mas consegui
vencer essa batalha. Comecei a
escrever poesia com catorze anos e
desde lá não parei.
Muitas poesias mostram minha
melancolia, minha tristeza e
angústia; muitas mostram meu lado
romântico, e mesmo sem ter
nenhuma companheira, criei uma
como os românticos faziam, mas
não tenho vícios nem sou
tuberculoso.
Muitas delas são psicodélicas,
pois crio infinitas alucinações,
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infinitas circunstâncias e
significados; às vezes escrevo sem
perceber, apenas obedeço ao
subconsciente, parece que meu
pensamento entra em transe, minha
alma fica calma e apenas vou
escrevendo o que uma voz esvai de
dentro de minha consciência.
Discorro diversas temas, abraço
infinitas sensações, inclusive a de
não sentir nada; não gosto de
apresentar algo superficial em
minha escrita, tudo tem sentimento;
nesta obra vocês também irão ver
muitas críticas, muito sobre política,
sobre filosofia, até mesmo a
psicologia estará presente.
Não tenho como descrever com
palavras o que estou sentindo, a
felicidade que é você estar entre
muitas pessoas que estão refletindo
sobre o que sua obra pode oferecer,
isso é muito importante para o
escritor.
Estou aqui com minha obra nas
mãos, estou muito feliz, logo aqui na
frente tem minha oração, vocês
poderão ler quando tiverem seus
exemplares, é uma experiência
única; sinto que estou em uma
constante redenção, estou saindo
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do fundo do poço, estou vendo uma
luz no fim do túnel.
Eu queria, por fim, agradecer
novamente suas ilustres presenças,
não sei se irão gostar de minhas
poesias, mas tenho uma frase que
diz que as coisas boas são
superiores às ruins.
E assim seria o discurso de George, ele se imaginava naquele
exuberante lugar, como música de fundo soava a melodia
sentimental, de Heitor Villa Lobos. Certo dia George tinha recitado
um poema a Megan, e passou em sua cabeça agora, ele não
tinha passado para um papel na época, mas agora tinha a
oportunidade, e passou a escrever:
CAMPO MINADO
Nossa vida é um campo minado,
Temos de dar o primeiro passo,
Porque o desconhecido é o incerto destino,
Pode-se eclodir ou explodir os sonhos.
Nas veredas dos arvoredos escuros
Há uma escada que leva ao infinito,
Há nas paredes ásperas e profundas
Excertos dos sangues de vários ritos.
No grito existencial da dor
Idealiza-se uma realidade paralela,
Onde as trevas nunca matam a luz,
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Onde há apenas uma estrada reta.
Cruzam-se cidades que estão flutuando
Sobre as nuvens da própria existência,
Onde há a musicalização dos prantos,
Que em suma, no inverno muda a aparência,
Porque o campo minado está vazio
E a mente esboçou vários motivos,
Inundou e esvaziou seu amargo medo
Em suas mãos pôs-se o sol, e nasceu.
A poesia era muito profunda, e batia perfeitamente com a
realidade, a frase e o lema de George batiam com tudo o que já
vivera, o poeta iria declamar esta poesia na cerimônia, iria ser o
destaque da noite.
A noite chegou e a lua começou a sorrir, ele já estava arrumado
e preparado para sua grande chance, seu terno elegante já
estava posto e ele estava com seus longos cabelos bem
penteados, todo garboso e estava treinando sua voz grave para
declamar seus sentimentos com bastante eloquência.
Pegou um táxi, seu relógio marcava sete e dez da noite, em
meia hora chegaria ao seu destino, estava ansioso, e certamente
quando ele chegasse já teriam algumas pessoas aguardando.
Estava com seu papel na mão, treinando bem a locução da
voz, tentando consertar de alguma forma algum erro, era
importante para ele fazer aquilo, visto que ele já tinha uma ideia
do que falar, sabia regular mais ou menos suas emoções, porém
nunca tinha falado em público.
Não tenhas medo de fazer o que lhe fará crescer.
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Surgiu essa frase em sua cabeça, de repente ele transpassou
ao papel; aliás, aprendera que sempre deveria sair com uma
caneta guardada no bolso, é sempre importante para um poeta
essa dica de sempre sair com uma caneta.
E o caminho estava se aproximando, e o poeta estava ficando
nervoso, o coração faltava pular do peito, o mel salientava os seus
lábios em cada palavra que dizia, mas estava muito ansioso
também. O taxista até pensou que ele estava passando mal, mas
tudo ficou certo e entendido.
O taxista puxou assunto e ficou sabendo que George ia lançar
um livro hoje, e ainda disse que sabia que um livro seria lançado
nesta noite, mas que não sabia que ele era o autor; ele sabia do
livro por causa das propagandas nas rádios e em cartazes que
foram espalhados por toda cidade.
Então George recitou o discurso para que o taxista dissesse se
estava bom ou não, e o homem disse que estava ótima, apenas
aconselhou o poeta para que pausasse mais no decorrer da
leitura, só isso. Tudo estava perfeito para George, apesar das
dificuldades ele conseguiu (como citado em seu discurso) a
redenção, ele poderia também ganhar muito dinheiro com
palestra.
A noite estava com o veludo da poesia, a névoa, a doce névoa
navegava sobre as nuvens, o deleite do luar trafegava no coração
do poeta, seus olhos guiavam o que não tinha fim, e seu olhar
movia as estrelas, em suma, dava beleza aos campos que não
estavam floridos.
George chegara no Teatro Amazonas, e havia uma imensa
surpresa:

 
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