Então mais um dia comum passou, mais planos alçaram-se no
ar, mais expectativas, e George teve a ideia de começar a
construir tudo aquilo que houvera há horas sonhado. Juntou cerca
de mil e quinhentos dólares, comprou alguns objetos antigos da
antiga loja do Sr. Beethoven para revender. Começou a espalhar
um poema às pessoas, como se fosse uma carta, escrevia aquilo
na máquina de escrever que comprara na loja de artigos antigos,
o poema era esse:
TEATRO DAS SERPENTES
Não seja capaz de enganar
Quem não engana a si mesmo,
Nem se autoengane ao achar
Que na mentira existe meio termo.
Não caminhe até o final
Para desistir no começo,
Não prove o que ninguém sabe,
Nem saiba mais que um terço
Da situação que te levará à morte
Na primeira palavra subsequente,
A verdade incontestável e libertadora
É perseguida e jogada na larva ardente.
Larva essa que consome o cérebro
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Superficial que em nada se baseia
Além do sofisma da cortina de fumaça
E das massas que rastejam à inveja,
Bela serpente que fala ao ouvido
Palavras doces em raízes de sangue,
Distopia perpétua em olhos errantes,
Que derramam ódio disfarçado de romance.
As pessoas ficavam admiradas com o talento de George,
alguns até ficavam curiosos.
— Você já tem um livro, filho? — perguntou uma senhora.
— Ainda não, minha senhora. Fico muito feliz de a senhora ter
gostado. — respondeu George educadamente.
— Se você tivesse um livro eu poderia lhe ajudar a lançar, meu
filho tem um amigo que é dono de uma grande editora, chama-se
Editora Churchill.
— A senhora poderia esperar até um ano para que eu pudesse
conversar com a senhora sobre este assunto? — perguntou
George.
— Vamos fazer o seguinte, filho: daqui a seis meses eu volto
nessa mesma data, nesta mesma hora, e você já pode me
apresentar o projeto de seu livro, se tudo ocorrer como previsto,
em mil novecentos e noventa e um você já terá o seu primeiro
livro lançado! — disse docilmente, a senhora.
— Muito obrigado, senhora. Então tudo dará certo! — disse
George, animado.
— Vou conversar com o meu filho sobre este assunto, vou
explicar-lhe a situação. Então, até daqui a seis meses, filho!
George saíra dali muito feliz, foi até a casa de Megan, e
chamou-a com um ar de notícia boa.
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— Querida, tenho uma ótima notícia! — disse George,
entusiasmado.
— O que houve querido? — questionou Megan, curiosa.
— Eu estava distribuindo esse poema e fazendo uma
propaganda desse meu trabalho, quando uma senhora gostou
muito do poema e disse que eu tinha talento, então ela perguntou
se eu tinha livros. Eu respondi que não, mas que pensara muito
sobre o tema, e ela disse que se eu tivesse um livro ela poderia
pedir para o filho dela convencer o amigo (que é dono da Editora
Churchill) a ajudar você no lançamento do livro. Portanto, ela
lançou-me uma proposta: que iria voltar a seis meses, no mesmo
horário, na mesma data para conversar novamente comigo; e ver
meu projeto de livro. Terei de juntar umas poesias que tenho para
lançar meu primeiro livro.
Megan ficou surpresa, muito feliz, e disse:
— Nossa! Querido, você pode lançar um livro com dezesseis
anos, pela maior editora da Inglaterra!
Os dois foram correndo à casa abandonada, para contar
quantas poesias George tivera feito; estavam guardadas na
gaveta. Ao chegarem lá, eles contaram uma quantidade enorme
de papel, George tivera feito tudo, contaram quantos poemas
dariam, e daria para fazer um ótimo livro:
CEM POESIAS!
— Você escreve muito, George. — disse Megan, surpresa.
— Inclusive inspirei-me para escrever agora, por incrível que
pareça. — disse George, em um tom brincalhão, mas sem deixar
de dizer a verdade.
George pegou a sua máquina de escrever (recém-chegada em
casa), e começou a filosofar:
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A VIDA
A vida não é a lição de casa,
É achar, portanto, que se sabe de tudo,
Para quando achar que se ganhou o mundo,
No fundo, aprender que não se sabe de nada.
A vida não leva ninguém ao fracasso,
É o sopro do vento, a energia da incerteza,
A tempestade de sombras que movem a fortaleza,
O brilho do sol, o silêncio da chuva, ou rancor escasso.
É compreender que sem sentido não há ida,
Pois se viemos ao mundo em busca do nada,
Sem objetivos, sem motivos, sem a lágrima
E o sangue de quem por nós deu a vida:
A morte levará a um rumo sombrio,
A pior das mortes, o pior dos castigos:
De se olhar no espelho e ver a solidão
Navegar no oceano de ódio e de inveja.
Isso destrói o que achas que não existe:
A alma, o futuro e uma saída.
Como padrão, agora deixaria o seu texto centralizado,
substituiria o simples pedaço de papel e a caneta pela máquina
de escrever, agora que queria lançar um livro. Sempre fora o
sonho de George ser escritor, ainda lhe faltava muito para ser
filósofo, mas ele gostava muito de estudar filosofia.
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Megan estava muito contente ao ver como namorado era
rápido ao escrever seus poemas, aquele durou apenas cinco
minutos para ser feito.
— Você é um ótimo poeta, meu amor, já pode até colocar essa
poesia no livro. Aliás, quantas poesias você deve colocar num
livro? — indagou Megan.
— No livro do Sir. Desconhecido e de vários outros tem apenas
cinquenta. Acabei de pensar em fazer diferente. Que tal eu
colocar cem poesias? Poderia muito bem fazer dois livros com
cinquenta poesias, porém quero me diferenciar nisto, não percebi
esse detalhe em meu sonho, mas lá eu me destacava por ser
autêntico. Aliás, qual faculdade você quer fazer?
— Sim, querido, você está se destacando por uma
característica autêntica, é algo que poucas pessoas têm coragem
de fazer hoje. Quero fazer a faculdade de psicologia, quero ser
uma importante psicóloga. E claro, crescer ao seu lado, para
conquistarmos nossa casa, para realizarmos nossos desejos. —
respondeu Megan, carinhosamente.
— Então eu não sonhei, vi um esboço do futuro! — disse
George, orgulhoso.
George lembrou-se do dinheiro que tinha, e convidou Megan
para um lanche. Enquanto estavam lanchando, George sentiu a
necessidade de escrever uma historinha, onde usaria da
imaginação, em um mundo colorido, sem nenhum problema, um
mundo muito bonitinho.
— Um poeta brasileiro escreveu certa vez um poema, eu posso
ler a você, querida? Não é romance. — perguntou George com
um ar irônico.
— Você vem bem detonar aquelas pessoas do bem, né
querido? — brincou Megan, sorrindo com os olhos.
— É inevitável! — disse George.
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HISTORINHA PARA DORMIR
Irei lhe contar uma historinha bonita
Para sentir-se em castelos e fortalezas,
Como uma cavalheira recitando ao donzelo,
Como um protótipo que encontra a pureza.
Era uma vez, em um mundo distante,
Onde unicórnios abraçavam as meninas,
Onde as princesas lutam como guerreiras,
Onde lutaram com as mouras e venceram!
Tinham de cristianizar os ferozes índios,
Atravessaram DEZ mares para garantir
A segurança dos afeminados homens,
Que cuidavam das crianças, num devir.
Eram dias cruéis para essas guerreiras,
Que sofreram em várias revoltas
E dessas revoltas tão revolucionárias,
Dos seios de Portugal, as Cavaleiras Templárias.
Essa historinha é demasiadamente triste,
Porque mostra que mulheres sempre foram exploradas,
Porque elas sempre faziam (e fazem) de tudo,
Os ociosos machos, sono e teciam crochê.
Ah! Sem contar que hoje elas podem votar,
Porque antigamente uma senhora boazinha
Observou a injustiça, e com sua voz retumbante:
Revolucionou e determinou que apenas burguesas
Poderiam ter esse direito, hoje afirmado por LEI!
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Ou seja, homens e mulheres pobres não podiam
Exercer o ato máximo e incólume da democracia
Mas para nossas perfeitas, empoderadas feministas,
Mulheres sempre foram descartáveis pelo DEMÔNIO.
Havia também nessa historinha lindíssima
Os grandes ideais de Xena e mulher maravilha,
Mentes prodigiosas que construíam imensos
E aterrorizantes monopólios da arquitetura,
Minado pelas suas forças que deslocam ilhas.
É verdade, amiguinhos, já estava esquecendo:
Meu corpo, minhas regras; aborto e drogas…
A mulher tem direito de fazer o que QUISER,
Não importando a opinião do ser inocente,
E se algum assassino que já matou homens
Ousar cometer crime com fêmeas é: MACHISMO.
Porque o que importa para revolução do ser
É dividir as pessoas e criar subcategorias a tudo,
À atrocidade feita pelos ímpios e tolos
Que deveriam ser punidos ao invés de condecorados.
Para terminar a historinha do cavalo de fogo
Falemos sobre a liberdade, pelo menos aqui,
Irretorquíveis fatos! Abstive-me para não me alongar.
MACHISMO mata, temos muitos exemplos,
Mas o nosso fervoroso socialismo é um alento
E nosso Marx, Che, Stálin, Mao ou Fidel são heróis!
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Espero mesmo que esteja com um sono desgraçado,
Não lhe chamei disso, leia direito: amiguinho…
Se estiveres com sono, remete-se à realidade,
Porque tu não caíste na asfixiosa armadilha vermelha.
— Então: o que você achou? — perguntou George, ansioso
pela resposta.
— Fantástico! Eu sei que foi você quem fez esse poema,
combina muito contigo, ainda mais contando a ironia.
— Eles são muito hipócritas, querida. Terei de combatê-los
veementemente, com todas as forças, com certeza serei muito
atacado por ser autêntico, porém tenho Deus e tenho você para
me ajudar a superar. — disse George, em seguida, dando um leve
beijo em Megan.