A pálida vertigem da noite desmaia em meus olhos, acordo-me atordoado com a tristeza que se abatera em instantes sobre a parede do quarto, bem como um reflexo no espelho sujo que denunciara a janela sem vida.
Levanto-me da cama abruptamente e uma montanha russa se faz sobre o cérebro, cambaleio como se estivesse bêbado e em segundos, retorno ao mundo.
Ali, em pé, nem entendo o porquê de ter levantado daquele jeito, e o tédio da madrugada se fazia presente como de costume, sempre com sua energia estática.
O relógio marcava meia noite e meia, e como o sono já não se fazia presente, simplesmente fui caminhar pelas ruas escuras, mais vazias que uma boca de fumo quando a polícia chega.
O vento no rosto fazia com que uma paz quase que instantânea preenchesse minha pele e o ar nos pulmões dava vida ao meu semblante exausto.
Um jovem a andar sem rumo pelo deserto de seus passos, a ouvir suas canções apaixonadas, a tentar subtrair da natureza um pouco de inspiração… assim alguém poderia descrever este poeta que sempre está sozinho, ao menos na presença ilustre de si mesmo.
Um casal estava a observar o luar imponente, cujo brilho refletia nas águas do caudaloso rio que, até mesmo calmo, parecia conter os mistérios do mundo sobre sua maciez.
Não sei que palavras eram ditas dentre as carícias, mas pude notar aquela chama ardente de outros dois jovens que provavelmente nunca esquecerão dessa noite.
A correnteza quase estática do rio é tão bela que quase me hipnotizou, e por uns instantes, talvez por influência de ter visto o casal, passei a imaginar que uma moça misteriosa estava ao meu lado, e que eu teria que conhecer seu íntimo para que fosse revelada sua identidade.
Até que imaginar coisas que só acontecem em literatura é interessante, e por alguns minutos até mesmo desenvolvi uma conversa profunda com essa moça hipotética. Mas claro que não falava sozinho, era tudo encenação da mente.
Andando mais um pouco, os bares lotados davam uma outra energia no ambiente. Um amontoado de bêbados se divertindo com o melhor que têm a divertir-se no final de semana.
Que ironia, tantas pessoas encontram subterfúgios em bebidas, e eu estava encontrando subterfúgio em sair sem rumo na madrugada para me conectar com pessoas que nem conheço sem sequer falar com as mesmas.
Nem o psicólogo mais aguerrido teria coragem de sair nessas horas, em risco de ser assaltado, só para tirar o tédio que quase enluta o cerne da própria solidão.
Bom, mas pude observar diversos seres artificiais, tristes, sem rumo, depositando a esperança momentânea em conversas inconscientes na interação social.
Ah! Mais uma noite assim, e quando olho no relógio já são quase duas horas, então resolvo voltar para o doce e querido lar. Como de costume também, pego o companheiro violão e tento compor uma música simples, mas o sono bate novamente. Escrevo esta crônica sem sentido algum, que provavelmente não será concluída de forma racional porque dormi.
Apenas para deixar registrado como algo escrito em um diário que ninguém vai ler.